ATA DA VIGÉSIMA OITAVA SESSÃO SOLENE DA PRIMEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA LEGISLATURA, EM 24-08-1989.

 


Aos vinte e quatro dias do mês de agosto do ano de mil novecentos e oitenta e nove reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Vigésima Oitava Sessão Solene da Primeira Sessão Legislativa Ordinária da Décima Legislatura, destinada a assinalar o transcurso dos trinta e cinco anos da morte do Presidente Getúlio Vargas. Às quatorze horas e quarenta e dois minutos, constatada a existência de “quorum”, o Sr. Presidente declarou abertos os trabalhos e solicitou aos Líderes de Bancadas que conduzissem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Ver. Clóvis Brum, 2º Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, no exercício da Presidência; Dep. Luis Abadie, 2º Vice-Presidente da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul; Prof. Bruza Neto, representando o Sr. Governador do Estado; Major Joel Guimarães, representando o Comando Geral da Brigada Militar; e Ver. Lauro Hagemann, 1º Secretário da Câmara Municipal de Porto Alegre. Em prosseguimento, o Sr. Presidente saudou os presentes, e concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Ver. Artur Zanella, como proponente desta Sessão e em nome da Bancada do PFL, salientou que o Requerimento que solicitava fosse realizada esta Sessão não é exclusivamente de sua autoria, posto que foi assinado pela maioria das Lideranças desta Casa, o que, segundo S. Exa., comprova a universalidade do estadista brasileiro. Salientou que Getúlio Vargas foi o primeiro gaúcho a se destacar no cenário político do País e que seu governo se distinguiu pelo nacionalismo e pelos ideais de modernização do País. O Ver. Lauro Hagemann, em nome da Bancada do PCB, discorrendo sobre a “era getuliana”, asseverou que as modificações políticas por ele realizadas são controvertidas, assim como o era a própria figura de Getúlio Vargas, enquanto político brasileiro. Analisou os acontecimentos da época, que levaram o político brasileiro ao suicídio. O Ver. Luiz Braz, em nome da Bancada do PTB, leu e comentou editorial do Jornal Hoje, desta Capital, do dia onze de setembro do ano de mil novecentos e cinqüenta e quatro, acerca da morte de Getúlio Vargas e da importância daquela personalidade para o País. Salientou as características do Presidente Getúlio Vargas, afirmando ter seu governo se pautado pelo nacionalismo, modernização do País, e melhorias para a classe trabalhadora. Abordando a questão eleitoral para a presidência da República neste ano, destacou o engajamento de Leonel Brizola com os anseios getulistas e discorreu sobre as razões que levaram o PTB a apoiar tal candidato. O Ver. João Dib, em nome das Bancadas do PDS e do PL, falou sobre o respeito e admiração que todo o povo deste País dedica a Getúlio Vargas, salientando ter ele sido um patriota em excelso e “um político que se manteve fiel a seus ideais”. Discorrendo sobre sua abnegação ao trabalho, desejou que seu exemplo sirva de modelo para a construção de um País melhor. O Ver. Adroaldo Correa, em nome da Bancada do PT, afirmou que seu Partido reconhece as conquistas dos trabalhadores a partir do governo de Getúlio Vargas, mas que não se deve deixar de analisar também as limitações e o contexto geral do plano econômico e social. Asseverou que a trajetória de Getúlio Vargas aponta rumos que devem ser refletidos e examinados. O Ver. Omar Ferri, em nome da Bancada do PSB, discorrendo sobre a história político-partidária do País, afirmou exigir a data de hoje muita reflexão. Afirmou que os ideais de Getúlio Vargas não são patrimônio exclusivo de um Partido político, mas ideais de revolução social que pertencem a todo o povo brasileiro. Alertou, ainda, que o “sacrifício de Getúlio Vargas simboliza a caminhada desse povo na busca dos rumos da história política desta Nação”. E o Ver. Dilamar Machado, em nome das Bancadas do PDT e do PMDB, analisou os acontecimentos ocorridos na época da morte de Getúlio Vargas, especialmente nesta Capital. Ponderando sobre as conquistas dos trabalhadores a partir do Governo de Getúlio Vargas, salientou que esse Líder Nacional continua vivo através das lutas dos trabalhadores e do povo brasileiro na busca de uma sociedade mais igualitária. Em prosseguimento, o Sr. Presidente fez pronunciamento alusivo à Sessão e agradeceu a presença de todos. Nada mais havendo a tratar, o Sr. Presidente encerrou os trabalhos às dezesseis horas e vinte e seis minutos, convidando as autoridades e personalidades presentes a passarem à Sala da Presidência da Casa, e convocando os Srs. Vereadores para a Sessão Solene a ocorrer a seguir. Os trabalhos foram presididos pelo Ver. Clóvis Brum e secretariados pelo Ver. Lauro Hagemann. Do que eu, Lauro Hagemann, 1º Secretário, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente e por mim.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Clóvis Brum): Estão abertos os trabalhos da presente Sessão Solene destinada a homenagear a figura de Getúlio Vargas, na passagem do 35º aniversário de morte.

Inicialmente solicito aos Srs. Líderes de Bancadas que acompanhem até o Plenário as autoridades presentes no Salão Nobre da Presidência.

Com a palavra, o Ver. Artur Zanella, autor da proposição desta Sessão Solene dedicada a homenagear a figura de Getúlio Vargas pela passagem do 35º aniversário de sua morte.

 

O SR. ARTUR ZANELLA: Exmº Sr. Ver. Clóvis Brum, Vice-Presidente da Casa, representando neste ato o Sr. Presidente e Srs. Vereadores, na verdade, Sr. Presidente e Srs. Vereadores, eu somente assinei em primeiro lugar o pedido desta Sessão Solene, eis que a maioria das Lideranças da Casa também assinou o Requerimento, numa demonstração da universalidade de Getúlio Vargas. Então, ressalvado esse aspecto, eu queria dizer, e me lembrava há poucos minutos disso o Ver. Wilton Araújo, que, tradicionalmente, ainda no tempo do PDS, nós pedíamos Sessões ligadas à figura de Getúlio Vargas, que criou dois Partidos: PTB e PSD no momento da redemocratização do País em 1945. Nada, nada mesmo obsta que estejamos todos, aqui, homenageando aquele que na Presidência da República foi o primeiro gaúcho a destacar-se no cenário brasileiro.

Getúlio Vargas, em 1930, ele personificava o movimento que modernizava o País. Getúlio Vargas, como Presidente eleito na Constituinte que se seguiu à Revolução de 30 é outro Getúlio Vargas; e um terceiro Getúlio Vargas aparece na cena política no Estado Novo; um quatro Getúlio Vargas, em 1950, assume pelo voto universal, direto, a Presidência da República. E, finalmente um Getúlio Vargas definitivo, em 1954, realiza aquilo que ele diz em seu testamento político: “Saiu da vida para entrar na história”.

E é por isso que estas Lideranças, hoje, Sr. Presidente, Srs. Vereadores, Srs. Convidados evocam a figura de Getúlio Vargas, uma figura que, apesar do tempo, ainda unifica o País. Uma figura que tem o respeito de todos os partidos políticos ou da maioria dos partidos políticos, mesmo aqueles que foram seus ferrenhos adversários e alguns, até, quem sabe, sofreram com a sua ação.

E é por isso, Sr. Presidente, Srs. Vereadores, que no dia de hoje estamos aqui, todos, irmanados, as Lideranças, para dizer que triste é o País que não cultua suas lideranças; triste é o Estado que esquece as suas figuras maiores e triste, Sr. Presidente e Srs. Vereadores, é a alma daquele que somente lembra-se dos rancores e das adversidades políticas e não, num dia como este, ergue sua palavra a Deus, para que tenhamos um País cada vez mais rico, um País cada vez mais unido e um País que, com suas adversidades, com todos os seus problemas, um País que consiga transferir essas riquezas que ele possui para a maioria de seus cidadãos.

É essa, Sr. Presidente e Srs. Vereadores, a figura que faço de Getúlio Vargas e por isso que hoje estou aqui, falando em nome do meu Partido e é por isso, tenho certeza, que os nossos convidados estão aqui, nesta tarde chuvosa, lembrando aquele que sintetizou a alma gaúcha num País continente. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Próximo orador, Ver. Lauro Hagemann, pela Bancada do PCB.

 

O SR. LAURO HAGEMANN: Ver. Clóvis Brum, no exercício da Presidência desta Sessão; Dep. Luiz Abadie, representando a Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul; Srs. Vereadores e Srs. Convidados.

O dia de hoje assinala o 35º aniversário da morte de Getúlio Vargas, uma figura controvertida no cenário político brasileiro. Controvertida porque, oriundo de um Estado como o Rio Grande do Sul, mais precisamente da zona missioneira, filho de fazendeiro, ele mesmo fazendeiro, foi galgando postos políticos, no tempo em que isto era possível, naquela escalada natural, até chegar por um movimento revolucionário à Presidência da República, em 1930.

Eu, individualmente, sou um inserido no contexto getuliano, porque, nascido exatamente no ano da assunção de Getúlio Vargas à suprema magistratura do País, acompanhei, por isso mesmo, toda a sua trajetória até o seu instante definitivo. Mas, mesmo morto, Getúlio ainda continuou a continua influindo em certas atitudes da vida brasileira, justamente pelo seu aspecto controvertido. Pretendeu dar a este País uma modernidade que talvez as condições econômicas, sociais não pudessem suportar as modificações políticas que ele introduziu, são por isso mesmo controvertidas. E podem ser, na sua primeira etapa, chamadas de autoritárias, de despóticas.

Numa segunda fase, a vida e a ação e a obra de Getúlio Vargas se revelam em outra dimensão. No seu mandato popular de 1950 a 1954, Getúlio, e isso os brasileiros não podem esquecer, foi quem possibilitou a criação da Petrobrás. No seu primeiro mandato, foi com ele que se estabeleceu, aqui, a indústria siderúrgica, que possibilitou, mais tarde, o avanço econômico em variados setores da vida nacional, especialmente na época jusceliniana, a introdução da indústria automobilística. Por tudo isso, a era getuliana ainda não está suficientemente esclarecida, ela é cheia de fatos claros e escuros.

Mas eu gostaria de, aproveitando este dia, 35 anos após, fazer um breve registro histórico, porque, nas Sessões Solenes e especiais desta Casa, também se faz história e se conta história. E esta história fica registrada nos Anais. Existem coisas que ainda não foram contadas, existem coisas que já foram contadas, mas que estão depositadas nos nossos Anais, para, um dia, serem reveladas.

Em 1954, neste dia, este País sofreu uma formidável comoção. Eu era então um jovem estudante. No início do mês de agosto, estava voltando do Rio de Janeiro no dia em que foi assassinado o Major Vaz. Naqueles tempos, os aviões do Rio de Janeiro levavam várias horas para chegar a Porto Alegre e, como estudante com passagem doada, eu tive que apanhar o primeiro avião da manhã e, ainda no avião, pude ler as manchetes dos jornais do Rio de Janeiro dando conta de que, naquela madrugada, havia sido assassinado o Major Vaz e que Carlos Lacerda havia sofrido um atentado, do qual escapara ileso. Nos dias subseqüentes – e foram mais ou menos uns vinte dias – ocorreu, neste País, uma campanha muito intensa para atribuir ao Presidente Getúlio Vargas, não a autoria material, mas a autoria intelectual daquele atentado, daquele crime, pelo que ele vinha sustentando contra Carlos Lacerda. E, no dia 24 de agosto de 1954, e, naquela época, eu fazia um programa de notícias, talvez, o mais importante do rádio sul-brasileiro, na Rádio Farroupilha, às 8 horas da manhã, do Rio, nos chegaram notícias telegráficas dizendo que aguardássemos os acontecimentos, porque a situação, no Rio de Janeiro, estava muito agitada. E, efetivamente, às 8h20min, 8h30min chegava a notícia do suicídio do Presidente Getúlio Vargas.

Então, esta Cidade, que havia assistido, por inúmeras vezes aos discursos de Getúlio Vargas nas sacadas do Grande Hotel, na Praça da Alfândega, e que tinha sido o berço da Revolução de 30, a Praça da Alfândega de então, onde ainda passavam os bondes, onde havia o Café Central, onde havia o Cinema Central, onde havia a Redação do Diário de Notícias, são coisas que a maioria dos meus colegas não lembra, porque são nascidos mais recentemente. A Cidade se comoveu, e a Cidade se agitou; muitos quebra-quebras foram organizados, o Consulado Americano foi atacado, depredado, e, inclusive, por uma analogia muito estranha, as Lojas Americanas também foram apedrejadas, e até a Importadora Americana também o foi. Por sinal, tudo que tivesse nome de americano foi atacado, e nós, da comunicação daquele tempo sofremos um grave revés, porque foi incendiada a Redação do Diário de Notícias, na Praça da Alfândega, e foi atacado o estúdio da Rádio Farroupilha, nos altos do Viaduto Otávio Rocha.

Ao final da manhã, também os estúdios da Rádio Farroupilha foram incendiados, e eu tive, por estas circunstâncias toda especiais, o privilégio de ter lido a última mensagem radiofônica do Rio de Janeiro antes que os estúdios e a rádio fossem incendiados. E tivemos que abandonar os escombros fumegantes sem que tivéssemos sido molestados, isto diga-se de passagem, os populares que incendiaram a rádio, eles não estavam visando as pessoas, estavam visando as instalações, porque a Rede do Sr. Assis Chateubriand, os Diários e Emissoras Associados tinham feito uma campanha muito intensa contra a figura do Presidente Getúlio Vargas. Isso aí é uma outra história, é apenas a contrariedade de satisfações não-atendidas que levou o capitão dos associados a dirigir as suas baterias contra a Presidência da República, naquela época o Sr. Getúlio Vargas. E havia, também, dentre nós, alguns companheiros de jornalismo, de radialismo que se associavam – por convicções partidário-políticas – a esta campanha do Sr. Assis Chateubriand. E contra isso se voltou a opinião pública da Cidade.

Isto nos deve servir até de reflexão, porque sempre que um órgão de comunicação se coloca contra os interesses da maioria da sociedade, ele acaba sofrendo alguma sanção. E naquela vez a sanção foi às últimas conseqüências. Naquele dia, 24 de agosto de 1954, ficamos, os funcionários da rádio, desarvorados, porque dispersos pela Cidade, fizemos uma assembléia aqui na Rua Marechal Floriano, na sede do Clube Pedritense, para ver que providências tomar e que recursos arrecadar para manter alguns que, como sempre jornalistas e radialistas, ganhavam muito pouco e como 24 de agosto ainda não alcançara o fim do mês, estavam todos sem dinheiro. Então se organizou uma campanha de angariação de gêneros e de fundos para atender aqueles mais necessitados. Dali nasceu a idéia da fundação de um sindicato da categoria, 1954. Naquele tempo havia três emissoras em Porto Alegre: Gaúcha, Difusora e Farroupilha. Não havia um milhar de radialistas na Cidade, mas eles estavam dispersos, como dispersa também estava a sociedade, não havia organização.

Nestes momentos de aprêmio e de angústia é que as criaturas se juntam para procurar um recurso comum. E o 24 de agosto de 1954 ficou na lembrança de todos aqueles que participaram dos acontecimentos, até os últimos que tiveram que abandonar os prédios às pressas, fugindo e se evadindo através dos muros que se comunicavam com outras residências para não serem atingidos pelos estilhaços, porque o fogo consumiu todo o prédio, inclusive o porão onde morava um funcionário dos Diários Associados, junto com a sua família que era bastante numerosa.

Isto são coisas da história desta Cidade acontecidas em função de um sucesso maior que ficou na História, não só do Brasil, mas de todo o continente como um dia tenebroso, em que um Presidente da República pressionado por uma campanha violentíssima, que na medida em que o tempo passa se vai descortinando qual era o verdadeiro interesse que havia por trás disso, estamos hoje assinalando. Desculpem estas reminiscências de ordem pessoal, muita coisa poderia ter sido dita ainda, são figuras que ainda vivem e convivem conosco, mas só o tempo será capaz de revelar em toda a sua extensão o verdadeiro papel de cada um, alguns não tiveram um comportamento adequado, outros tiveram uma atitude exemplar. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Próximo orador é o Ver. Luiz Braz, pela Bancada do PTB.

 

O SR. LUIZ BRAZ: Sr. Presidente, Srs. Convidados, Srs. Vereadores, eu diviso daqui muitos integrantes do Partido Trabalhista Brasileiro que vieram aqui para prestigiar esse ato, eu quero agradecer a presença de todos os senhores e dizer que, como o Ver. Lauro Hagemann, ao contrário deste Vereador eu não tive a ventura de poder viver no mesmo palco dos acontecimentos como viveu o Ver. Lauro Hagemann, por ser alguns anos mais jovem, que não é assim uma virtude nesse caso, Ver. Lauro Hagemann, mas apenas até para dizer a este Plenário que o que eu sei sobre a História não é porque eu vivi esta mesma História na mesma época em que relatou aqui o Ver. Lauro Hagemann, mas porque eu sempre procurei estar a par daquilo que ocorria naqueles anos conturbados da vida política e social brasileira.

Eu vivia, naquela época, numa cidade muito pequena do interior, muitas vezes ela não tem a possibilidade de participar de todos os acontecimentos e de sentir todos os acontecimentos como aqueles que estão bem próximos no palco dos acontecimentos. Mas eu tenho aqui, por exemplo, uma edição do Jornal Hoje, número 26, aqui de Porto Alegre, do dia 11 de setembro de 1954. É que esse jornal foi editado apenas alguns dias após o passamento do ex-Presidente Getúlio Vargas. E no editorial de capa que eu faço questão de apresentar diz assim: “Um nome passa à História. A importância de um homem que enfeixou em suas mãos mais de 20 anos de poder não poderá ser esquecida de um momento para outro. Sua influência se projetará pelos dias vindouros além das coisas e nos homens deste País. Não será a paixão dos que o atacaram nem o ardor dos que o defenderam que determinarão o valor de Vargas e seu legado político. A marcha dos acontecimentos, o jogo frio da história definirão a herança e as conseqüências da passagem de Vargas pelo poder”. É o Jornal Hoje, do dia 11 de setembro de 1954, que era vendido ao preço de dois cruzeiros naquela época. Na contracapa do jornal há, também, uma manchete importante dizendo: “‘Gregório confessou.’ Ao encerrarmos esta edição recebemos a notícia de que Gregório confessou ser o mandante do atentado da Rua Toneleros.”

Agora, eu deixo o jornal de lado para dizer que como eu não sou um participante dessa história, eu tenho que apenas ser crítico dessa história. O ano de 1930, que marcou o início da caminhada política de Getúlio Vargas, foi um ano dos mais importantes na História brasileira. As três grandes forças que impulsionam o universo estavam presentes na vida brasileira: a força, a sabedoria estavam lá, presentes, e não podia faltar, também, nesse ano, a própria beleza. A beleza não tinha muito a ver com os acontecimentos políticos da época, mas não podemos deixar de lembrar que no ano de 1930 uma gaúcha, pela primeira vez, conseguia-se eleger Miss Universo, exatamente no mês de agosto. Iolanda Pereira, gaúcha que pela primeira vez dava um título de beleza ao Brasil, por isso, a beleza estava presente no ano de 1930. A força também lá estava presente, porque os acontecimentos daquela época marcavam para o mês de março, exatamente no dia 1º de março de 1930, as eleições presidenciais. Estavam-se defrontando, de um lado, aquele que era integrante da política café-com-leite, Júlio Prestes, que traíra esta política café-com-leite, fazendo com que o candidato fosse de São Paulo e não de Minas Gerais. De outro lado o candidato da Aliança Liberal, Getúlio Vargas, tendo como seu Vice-Presidente o candidato João Pessoa. E naquele embate que se travou dia 1º de março, o vitorioso não foi Getúlio Vargas, Getúlio que teve a sua vida cravada de vitórias populares, naquele ano de 1930, no dia 1º de março, não se saiu vitorioso, vitorioso foi Júlio Prestes. Mas aí é que digo que a força, também, estava presente em 1930. E um golpe muito antes que Júlio Prestes pudesse tomar posse, um golpe que aconteceu no mês de outubro acabou destituindo o Presidente Washington Luiz e colocando à frente dos destinos da Nação Brasileira aquele que idealizou o golpe, Dr. Getúlio Vargas. Ali estava presente a sabedoria do Dr. Getúlio Vargas, estava presente a força e estava presente a beleza. São três grandes potências que impulsionam todo o Universo.

A vida do Dr. Getúlio Vargas para o Brasil foi de máxima importância, porque foi, exatamente, com a sua trajetória que tivemos no Brasil, uma vitória dos trabalhadores frente ao coronelismo que massacrava todo o povo até 1930. Foi com Getúlio Vargas que tivemos o voto secreto, foi com Getúlio Vargas que a mulher começou a ter direito ao voto. Foi com Getúlio Vargas que o trabalhador começou a ser respeitado, que começou a ter o seu salário mínimo. Foi com Getúlio Vargas, exatamente, que as classes populares começaram a ter o seu valor realçado. Até que no ano de 1945, quando Getúlio Vargas já estava prestes a deixar pela primeira vez o poder, encerrava aí a História do Estado Novo.

Surgia no Brasil um movimento intitulado “Movimento Querenista”, que exatamente no ano de 1945 conseguia reunir no Rio de Janeiro cerca de 11.000 pessoas que gritavam: “Queremos Getúlio, queremos Getúlio”, e foi exatamente por essas palavras de ordem: “Queremos Getúlio”, que o movimento se intitulou “Movimento Querenista”. E mesmo o General Dutra, que havia escolhido pela coligação PTB-PSD para ser o candidato da situação, não se sentia tranqüilo como o possível candidato, porque ele sentia que os vários setores da sociedade, que o povo em si queria exatamente a continuação de Getúlio Vargas.

E eu digo aos senhores que foi exatamente nesta época, 1945, que Getúlio disse uma frase que ficou célebre e que marca, exatamente, essa passagem falando da importância que tinha Getúlio e o que ele representava para esse povo. Dizia Getúlio em 1945: “Estou num dilema, sinto que é preciso agüentar um pouco mais, esperar terminar a guerra, preparar o País para a paz, passar o governo para o meu sucessor e me afastar da vida política, mas cansei, estou enojado de tanta infâmia, a minha vontade é renunciar”. Apesar de ter vontade de renunciar em 1945, ele de fato não chegou a renunciar, foi afastado do governo pelos Generais Dutra e Goes de Monteiro.

Passado esse episódio, passado o Estado Novo, que terminou exatamente em 1945, veio o período de Dutra que começou em 1946 e, logo após, em São Borja, um outro gaúcho muito famoso e que depois se tornaria, realmente, da maior importância para a vida política brasileira, Dr. João Goulart, exatamente no dia do aniversário de Getúlio Vargas, no dia 19 de abril, no ano de 1949, reacendia o “Movimento Querenista”. E, ao reacender o “Movimento Querenista”, lançava novamente Vargas para a sua campanha em busca da Presidência da República. Mas Vargas, que era um político muito astuto, sabia que a sua caminhada para voltar a ser Presidente da República poderia se esmagar num outro grande nome que já surgia naquela época, e que vinha lá de São Paulo, Dr. Ademar de Barros. E, por isso, antes mesmo de lançar a sua campanha à Presidência da República, ou começar a sua trajetória para Presidente, ele conversou com o Dr. Ademar de Barros, acertou com o Dr. Ademar de Barros uma coligação. E, naquela época, então, o candidato que pertencia à ala do Dr. Ademar de Barros, Café Filho, foi concorrer a Vice-Presidente ao lado do Dr. Ademar de Barros.

Corria, naquela época, um boato que a força de Café Filho seria realmente muito mais forte que a própria força popular de Getúlio Vargas. Mas Getúlio Vargas calou, realmente, a boca de todos aqueles que o criticavam, quando, nestas eleições conseguiu algo que dificilmente um candidato conseguirá reeditar em toda a vida nacional. Naquela época, 48,7% dos eleitores votaram em Getúlio Vargas. Eu fiz a lembrança de Café Filho e a alusão de que aqueles que acreditavam em Café Filho, acreditavam que ele pudesse fazer mais votos que Getúlio Vargas, porque, naquela época, se votava separadamente para Presidente e para Vice-Presidente da República.

Um dos episódios que eu quero ressaltar é que em 1945, quando Vargas deixa a Presidência da República, ele vai concorrer a Senador e também a Deputado. É exatamente nessas eleições que ele consegue se eleger Senador por dois Estados, e Deputado por nove Estados. Também naquela época acontecia uma eleição diferente, sendo que Senadores e Deputados não se elegiam só por um Estado, elegiam-se por vários Estados brasileiros, conforme nos relata a História.

Mas os grandes adversários de Getúlio Vargas podem ser detectados. Eu vou fazer menção a um nome que foi muito debatido, há poucos dias, aqui neste Plenário. Um dos grandes escritores da primeira metade do século: Gustavo Barroso. Eu faço menção a este nome porque Gustavo Barroso era um dos escritores prediletos de Getúlio Vargas. O filho de Gustavo Barroso fazia parte da segurança de Getúlio. Gustavo Barroso, no seu livro “Brasil Colônia de Banqueiros”, conta a história da formação da dívida externa brasileira e diz de como o dinheiro que chegava até o Brasil ficava pelo caminho, muitas vezes nas mãos de pessoas que não queriam nada com a história brasileira, que queriam apenas satisfazer interesses particulares. E, na sua Carta-Testamento, Getúlio tem uma referência exatamente a este livro que, quem conhece o livro e conhece a Carta pode facilmente detectar. Diz assim Getúlio Vargas: “Assumi o governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores de trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constantes de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café”. Ele já dizia, naquela época, que naquilo que nós importávamos existia fraude no valor de 100 milhões de dólares ao ano. Imaginem os senhores que, ao combater tudo isto, ao combater o capital estrangeiro, ao sempre se declarar nacionalista, ao sempre combater pelas coisas nacionais, ele começou a sofrer a oposição de determinados grupos que estavam muito mais à mercê do capital internacional, e aqui no Brasil, para defender muito mais os interesses internacionais do que os interesses nacionais.

E digo que esses mesmos grupos daquela época estenderam os seus tentáculos, cresceram, ficaram mais fortes e são, muitos deles, os mesmos grupos de hoje. E cito, como exemplo, uma CPI que foi formada para saber de atos corruptos no Governo de Getúlio Vargas, e devo dizer que essa CPI não conseguiu encontrar atos corruptos no Governo Getúlio Vargas. Mas essa CPI também averiguava as facilidades que Samuel Weimer, que era do Jornal Última Hora, tinha para conseguir do Banco do Brasil financiamento para o seu jornal. Essa CPI foi formada, então, contra Getúlio Vargas, e contra Samuel Weimer, e basta que os senhores leiam qualquer livro que conte a história da época, e verão que o Globo, por exemplo, que fazia uma campanha cerrada contra Getúlio Vargas, também era um dos grandes devedores do Banco do Brasil. E os outros jornais da época, que também faziam campanha contra Getúlio Vargas, também eram grandes devedores do Banco do Brasil. E o Globo daquela época, que cresceu, cresceu, e se transformou nessa grande Rede Globo de hoje, por incrível que possa parecer, continua combatendo um candidato que tem a linha trabalhista, e, que já, naquela época, cerrava fileiras junto com Getúlio Vargas, e que por isso mesmo merece de nós, do PTB, pelo menos, de um grupo acentuado do PTB, o maior respeito e todo o apoio possível para a sua caminhada até a Presidência da República, porque este homem é combatido pelos mesmos grupos que derrotaram Getúlio Vargas, ou pelo menos, por alguns desses grupos, Dr. Leonel Brizola. (Palmas.)

Eu faço esta referência ao Dr. Leonel Brizola até para explicar o porquê, muitas vezes, de muita gente não entender o posicionamento que toma parte do PTB do Rio Grande do Sul ao apoiar o Dr. Leonel Brizola. A identidade que o Dr. Leonel Brizola traz, das lutas efetuadas por Getúlio Vargas. A identidade dos próprios inimigos declarados, da época de Getúlio Vargas. Os objetivos de Vargas, os objetivos nacionais. Os objetivos contrários à exploração do capital internacional, ao nosso próprio capital, todos estes objetivos se identificam plenamente com os objetivos defendidos pelo Partido Trabalhista Brasileiro, sabedores de que a vida nacional brasileira pode tomar novos rumos se ela for comandada por uma ideologia trabalhista. Se ela tiver objetivos trabalhistas, se ela voltar aos ideais de Vargas, nós, do Partido Trabalhista Brasileiro temos a honra maior de estarmos aqui tentando reavivar estas memórias, este passado, estes acontecimentos que enchem de orgulho este Partido que teve como seu primeiro Presidente, no ano de 1945, aquele que foi o maior Presidente da história política do Brasil, Dr. Getúlio Vargas. Sou grato. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Próximo orador é o Ver. João Dib, que falará em nome da sua Bancada, o PDS e pela Bancada do PL.

 

O SR. JOÃO DIB: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, Srs. getulistas aqui presentes. Em nome do PDS e do PL é que eu dirijo a palavra aos senhores neste momento.

Cresci aprendendo a admirar e respeitar uma figura simpática e muito querida do povo brasileiro, uma figura que carinhosamente o povo brasileiro se referia a ela dizendo o “Gegê”. Meu pai, um estrangeiro, como tantos outros estrangeiros também tinha profunda admiração por aquele homem que dedicava um imenso amor à Pátria, um imenso amor ao trabalho, um imenso amor ao seu semelhante. E, hoje, eu me sinto muito feliz, porque, passados 35 anos de sua morte, eu ainda posso continuar a admirá-lo, eu ainda posso citá-lo, eu ainda poso dizer que foi um grande brasileiro, que deu o melhor de si à sua Pátria, deu o melhor de si ao seu Estado. Foi Secretário da Fazenda do Estado, Presidente do Estado, Deputado Estadual, Deputado Federal, eleito Senador, Presidente da República, mas em cada posição que ocupava, ele procurava dar o melhor de si e os seus adversários nunca encontraram razões maiores contra a sua dignidade, a sua honradez, contra o seu amor à Pátria, contra o seu amor ao seu Brasil.

Hoje, quando se vivem momentos em que os políticos passam de partido para partido, têm até dificuldades em verem seus nomes registrados para os postos que pretendem, nós lembramos com carinho um homem que podia com toda a tranqüilidade dizer: “Eu vos dei a minha vida e agora ofereço a minha morte, nada receio”. Quantos, neste momento, vivem neste País que seriam capazes de dizer que se mantiveram fiéis às suas idéias? Quantos dos políticos, tão desacreditados, poderiam olhar para o povo e repetir as mesmas palavras de ontem? Quantos, como Getúlio poderão ser considerados estadistas, num mundo em que não há estadistas. Getúlio foi um grande estadista, como o Roosevelt, como De Gaulle, como Churchill, como Stalin, como Chamberlein, como Hitler, Mussolini – por que não? – Encantavam o mundo com sua palavra. Ele conseguiu ser um estadista.

E hoje, quando no mundo não tem grande número de estadistas, o que nós vemos daqueles que deveriam nos orientar, deveriam nos assegurar tranqüilidade, nós vemos a insegurança que eles nos dão. A cada dia ao sabor dos seus interesses próprios se vota, a cada dia no sabor dos seus interesses próprios se assumem posições. Não era este o Getúlio Vargas que hoje muitos apregoam o seu nome, muitos tentam utilizar o seu nome, mas não lhe seguem o exemplo de forma nenhuma.

Este homem realmente deveria ser modelo, deveria ser exemplo, mas não deveria ser aproveitado, de forma muitas vezes muito indigna por alguns que citam o seu nome, mas não lhe seguem o exemplo. Este homem que numa formatura da Faculdade de Medicina aqui em Porto Alegre, no seu discurso – e que sabia falar com o povo – dizia: “É preciso trabalhar, trabalhar com dignidade, trabalhar com abnegação, trabalhar como trabalham as abelhas, não para si, mas para a colméia”.

E o que nós vemos, hoje, com tristeza, quando passados 35 anos daquele grande momento de convulsão que viveu o País, quando um patriota provado por todos os títulos, dava sua vida para preservar a sua Pátria? O que nós vemos, hoje, é que não está trabalhando para a colméia a grande maioria. A grande maioria está trabalhando para si mesmo. Mas é possível que relembrando essa figura extraordinária, 35 anos depois, alguns mais se somem àqueles que continuam trabalhando pela coletividade, e é possível, então, que, em memória de Getúlio Vargas, nós tenhamos um Brasil melhor. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra, o Ver. Adroaldo Corrêa, que fala pela Bancada do PT.

 

O SR. ADROALDO CORRÊA: Sr. Presidente, Ver. Clóvis Brum; Senhores da Mesa, que não tenho o nome aqui, a não ser do Dep. Luiz Abadie, representante da Assembléia Legislativa; companheiro Bruza Neto, que representa o Sr. Governador do Estado; Sr. Representante do Comando da Brigada Militar, Major Joel Guimarães; camarada Ver. Lauro Hagemann, 1º Secretário da Câmara Municipal; Srs. Vereadores, Senhoras e Senhores.

O Partido dos Trabalhadores tem uma reflexão histórica, uma crítica e uma visão de construção do processo histórico que gostaria de abordar nesta Sessão de homenagem ao 35º ano, reverenciando o falecimento de Vargas, nas condições em que ocorreram de contradição do processo econômico, social e político brasileiro naquele ano de 1954; e uma visão que gostaríamos de dizer que obedece a outro ritmo que não apenas o ritmo das individualidades da pessoa. Que não quer retirar o brilho da grande figura pessoal que foi Getúlio Vargas, mas quer situá-lo nas condições objetivas, nas relações da economia brasileira, das relações políticas que se deram e conformaram a sua trajetória.

A Revolução de 30 ocorre neste País num processo que enfrenta a dependência deste País em função do modelo agrário exportador que o dominava, que o hegemonizava e que de certa forma impedia a própria soberania nacional na medida em que o produto vendido lá fora acaba determinando que aqui dentro se faça a vontade do comprador, aquele que detém o mercado. Deu-se assim, com a crise do café, por exemplo, apenas para um grande exemplo. O modelo agrário exportador é enfrentado pela Revolução Liberal que tenta instituir um projeto que busca, sim, o nacional, que tem como capitão desse projeto o político Getúlio Vargas.

Esse projeto nacional se confronta com as forças do conservadorismo que estavam, naquele momento, expressas mais claramente no café-com-leite, sim, mas nos latifundiários agrário-exportadores de São Paulo e Minas, hegemônicos na política nacional desde a fundação da República, jovem em 1930, ainda jovem, hoje, aos 100 anos. E, desses 100 anos, Vargas cumpriu 20 anos à frente da Presidência desta jovem República. E, nos primeiros 15 anos, de 1930 a 1945, basicamente consolida um processo que visa fazer desaguar nesse conjunto as expressões que se dão no plano econômico e no plano social, dos movimentos dos trabalhadores e da construção daquilo que se vem a chamar depois de “início do processo de industrialização e da substituição de importações”, que poderiam – e até hoje se busca, através desse processo – consolidar a soberania nacional de fato. E, portanto, um patriota também neste aspecto.

Um homem contraditório, sim, porque obedecendo aos ritmos das contradições da sua época, soube visualizar a direção política do seu projeto, do que podemos discordar, mas que foi implementado, que se expressa, ao nível do campo do trabalho, na Consolidação das Leis do Trabalho, no início da década de 30, e que tem uma relação com esse movimento sindical, que, no início, é anarquista, que, no início é libertário, que, no início, também é de auto-socorro, mas não tem regulação em lei, mas que recebe as leis, não por elaborá-las, o próprio movimento, mas por uma concessão do Estado que, obviamente, ao conceder, também amarra esse movimento nesse processo.

Nós, do Partido dos Trabalhadores, sabemos da importância da autonomia, da independência da organização dos trabalhadores em seus sindicatos, reconhecemos as conquistas e os avanços estabelecidos dentro do processo da Consolidação das Leis do Trabalho e reconhecemos as suas limitações que significam, no seu conjunto, camisa-de-força em relação a esta auto-organização dos trabalhadores. Mas é um avanço no processo social, na medida que não havia leis em relação ao trabalho, reconhecidas e constituídas, de forma a serem reivindicadas e garantidas numa luta.

De alguma forma, o projeto construído e concebido durante a primeira fase do Governo Vargas, a partir do Estado Novo, só vai-se implementar de fato a partir de sua ausência da direção política, de 1945, principalmente, com o interregno da guerra. Com os países imperialistas voltados aos seus interesses maiores em outras fronteiras que não a dominação deste País, que até hoje sofre a dominação imperialista do capital internacional, o Brasil pôde desenvolver de alguma forma um ou dois aspectos fundamentais de sua indústria de base, a siderurgia começa a se implantar com uma perspectiva de substituição acelerada em função da ausência de importações ao nível das necessidades brasileiras. A população nascente urbano-industrial concentrando-se, ampliando-se. E chega-se à segunda fase do Governo Vargas. Para citar uma afirmação que não ousaria fazer aqui, mas que está consolidada num trabalho de Otávio Ianni “Colapso do Populismo no Brasil”. Não ousaria dizer que é o colapso. Talvez, possamos verificá-lo em breve, seus resultados e a certeza desta afirmação.

Um Vargas que dizia, em 1938, citado de suas manifestações na Presidência da República “Que o Estado não quer, não reconhece a luta de classes. As leis trabalhistas são leis de harmonia social”. E que, em seguida, a partir de 1947 passa a dizer que “O Partido Trabalhista Brasileiro” – daquela época – “é arma política do proletariado. E tenhamos a certeza que a luta que hoje travamos não será vã, porque já se deixou no espírito da nossa gente a influência decisiva que se processa, configurando o sistema da igualdade social. No futuro, a sociedade brasileira não se subdividirá mais entre ricos e pobres, poderosos e humildes. Será um povo unido pela compreensão, pelo senso da realidade, para a felicidade comum”. Isso em Vargas, por ele mesmo, a primeira afirmação de um homem que se relacionava com a massa diretamente; a segunda afirmação, de um homem que aposta no partido e na organização, é uma contradição e uma evolução. Na medida em que a primeira é de 1938 e a segunda é de 1947.

Os rumos da economia que determinam as condições objetivas de existência das grandes massas, e dos grandes homens, têm que ser analisados no processo de exame e de reverência a um Presidente que governou 20 anos uma Nação. Uma República jovem. E, com certeza, nos ensina, por todas suas ações e todos os seus gestos, tanto em relação à política econômica, à política social, como o seu gesto final e individual, a certeza de que a relação com a política tem que ser verdadeira, porque a história cobra.

A história cobra de fato e definitivamente de todos nós. E pela cobrança que essa história faz, é que falo que duvido um pouco da afirmação de Otávio Ianni, de que o populismo, a relação direta com as massas dispersas, inorgânicas, esteja realmente em colapso. É que a organicidade que nós pretendemos e que Vargas afirmava em 1947, que o seu PTB deveria ser o projeto de partido do proletariado no Brasil, nos impõem essa dúvida. E Vargas, com certeza, na sua evolução, nos aponta rumos a estudar, rumos que se dão, hoje, também na relação direta de alguns candidatos à Presidência da República com as massas dispersas, não mais pelo rádio, não mais pelo discurso vibrante de um orador, que também o era Vargas, mas pela Rede Globo, pelas televisões; fácil de fazer, como faz o Fernando Collor de Mello, e que não tem compromisso real com as perspectivas do País, da nacionalidade, da soberania brasileira. E que, no entanto, faz um discurso direto à população, sem obedecer a seus ritmos de organização para respaldo do que vier a conquistar posteriormente, para estar no poder, consolidado numa base que possa permitir exercê-lo. Este é um nó que vamos desatar em 15 de novembro e, posteriormente, em um segundo turno, a 17 de dezembro. Estará em colapso este tipo de relação na sociedade brasileira? A afirmação aqui é de 1977, ainda no período da Ditadura Militar, que consolidou um dos processos que Vargas encontrava em disputa dentro do seu Governo e que o levou à morte em 1954, que era a soberania nacional.

A disputa que havia naquele momento era entre entregar ou controlar a forma da remessa de lucros, que controlava a perspectiva de por onde ia o projeto nacional brasileiro naquele momento. E todos conhecemos a história de Carlos Lacerda. Nacionalista, jamais foi. Pregador das igualdades entre as pessoas, jamais foi verdadeiramente, e era o principal adversário de Vargas. O imperialismo tem seus interesses aprofundados neste País, consolidados e espalhados em todas as situações de relação objetiva da vida social neste País, na relação econômica, cultural, pela dominação que se expressa através dos diversos poderios aqui construídos: ideológica e politicamente, com aliados internos neste País, como tinha aliados internos neste País no capital que queria se associar ao capital monopolista e que desafiou o ritmo e rumo que Vargas, Presidente nacionalista, que buscou através da via da disputa com o capital hegemônico internacional aqui construir um processo nacional, do que é exemplo a fundação da Petrobrás e outros tantos projetos que se poderiam enumerar e que lhe dizem respeito e lhe definem o tamanho de figura que representou para a história brasileira. Vinte anos numa República de 100 anos é realmente uma experiência a examinar, para o aprendizado. Seja para reproduzir, seja para não incorrer em algumas falhas, nos mesmos erros. Mas é para respeitar! Muito obrigado.

 

(Revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra, o Ver. Omar Ferri, que falará em nome da Bancada do PSB.

 

O SR. OMAR FERRI: Exmº Sr. Ver. Clóvis Brum, 2º Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; meu prezado amigo e colega Lauro Hagemann, 1º Secretário da Câmara Municipal de Porto Alegre; prezados Srs. Vereadores; minhas senhoras e meus senhores.

É, ao mesmo tempo, muito fácil e muito difícil falar de uma das figuras mais importantes e um pouco controvertidas da História dos Estados Unidos do Brasil. Eu falo com alguma emoção, eu acompanhei aquela época.

Eu tinha uns 22 ou 23 anos e era estudante do segundo ano da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e me lembro dos acontecimentos com muita emoção. Quando eu digo com muita emoção, eu digo que fala desta tribuna um radical e extremado getulista e trabalhista. Radical, no mais pleno e abrangente conceito do termo. Os senhores, acredito, na maioria são todos mais novos do que eu, que tenho 56 anos. Mas eu ainda me lembro. Eu acompanhava, milímetro por milímetro, minuto por minuto, todos os acontecimentos que, na época, ocorriam na Capital da República, Rio de Janeiro.

A Faculdade começava às 8 horas e, às 8h45min, terminava o primeiro período da aula. Era Presidente do Centro Acadêmico Maurício Cardoso o ilustre Governador do Estado, Pedro Jorge Simon, e eu era o Secretário. E era nosso colega de aula o Sr. Flávio de Freitas Tavares, que concorreu com Lauro Hagemann, e que venceram, na época, as eleições para a Presidência da União Estadual dos Estudantes.

De repente, uma notícia estourou, como um rastilho, como uma bomba: o Presidente Getúlio Vargas tinha-se matado. Se os senhores abrirem o jornal Correio do Povo daquela época, vão ver as sedes do PSD – Partido Social Democrático, vinculado à extrema direita até à medula dos ossos, um partido traidor da Pátria, do povo e deste País. Se os senhores se lembrarem das notícias dos jornais, vão ver a UDN, traidora e golpista, vinculada aos interesses antinacionais e os interesses canalhas. Os senhores poderão abrir o “Correio do Povo” e verão, numa fotografia, este orador com uma camisa que, naquela época, tinha uma balança e o símbolo das leis no peito e que participava das agitações e das invasões que o povo, revoltado, fazia aos partidos traidores da Pátria e traidores do povo. Mais uma vez, na história deste País, se obrigou um homem decente e um homem de bem, que preferiu morrer com honra e glória e passar para a história na defesa do povo, do que se submeter à vontade inexorável dos trustes e cartéis e das multinacionais que levavam deste País lucros de mais de 500% do capital aqui aplicado.

Naquela época não existia nenhum partido de vanguarda neste País, porque a vanguarda ideológica, histórica, salvadora, redentora deste País chamava-se Partido Trabalhista Brasileiro. Com a morte do Getúlio Vargas, morreu também a bandeira desfraldada do patriotismo e do nacionalismo, em que nacionalismo significava o patriotismo em posição de luta em busca do ideal nacional popular.

Eu saí da Faculdade de Direito da PUC com o Simon e com o Flávio Tavares e, em frente ao local onde hoje se situam as Lojas Americanas, encontrei um udenista que procurou justificar a canalhice de um cidadão chamado Carlos Lacerda, um dos maiores exemplos da indignidade deste País, embora inteligente, e todo o cidadão que passa do comunismo para a ponta direita, além de canalha e traidor, é podre de ideal e de sentimentos. Lacerda era um homem assim, apesar de inteligente, e apesar de ser um fora-de-série. Mas naquele dia encontrei o José, que não vou dizer o sobrenome, hoje, um advogado famoso, Vereador, depois passou para o PMDB, como muitos outros, como muitos outros sepulcros caiados que foram passando. A História do Brasil é uma história de passagens. O PSD se tornou PDS e a ideologia do PDS passou também para o PMDB para que as coisas continuassem as mesmas.

Eu estava tão revoltado com o supremo ato de um Presidente brasileiro que eu admirava, que eu não ousava que alguém se atrevesse a falar mal do homem naquele dia. E este tal do Dr. José se atreveu. Eu sou um cidadão tremendamente passional, eu confesso isso. O entrevero foi salvo pelo Flávio Tavares, que hoje se encontra de passagem por Porto Alegre, e pelo Simon, meu fraternal amigo Simon, que hoje é o Governador do Estado.

Então, vejam bem, eu pediria para os senhores, o exemplo da lição da nossa História, da lição dos políticos antigos. Por exemplo, apontem um ato desonesto do Júlio de Castilhos, que foi Governador do Estado; Borges de Medeiros: que se atreva alguém a apontar uma atitude indigna de um Governador do Estado chamado Borges de Medeiros e que apontem um ato desonesto de um cidadão chamado Getúlio Vargas, um só. Ou até de João Goulart, ou até de S. Exª o Presidente de toda Nação chamado João Goulart. E vejam que não é um PTB, nem é um PDT quem fala, é um PSB que acompanha a dialética da história.

Eu me lembro, Sr. Presidente dos trabalhos, que quando Getúlio Vargas se matou, por onze dias foi Presidente deste País um cidadão chamado José Linhares. Nomeou toda a sua parentagem num ato de indignidade, e a lei contra remessa de lucros, chamada Lei Malaia, Malaia porque quem formulou a Lei Malaia se chamava Agamenon Magalhães, que tinha feições Malaias. Onze dias depois a Lei Malaia era derrogada, para que estes 500% de lucro das empresas multinacionais aumentassem cada vez mais e a espoliação deste País continuasse de maneira constante e perene.

Eu não posso ser socialista hoje, Prof. Bruza Neto, sem antes ter sido do MDB e sem antes ter pertencido ao PTB. Impossível que alguém fosse hoje socialista sem ser antes brizolista e getulista, porque no mundo as histórias se unem e, hoje, Omar Ferri é a soma de suas atitudes e de seus partidos do passado. Esta é a dialética da filosofia da história político-partidária.

Getúlio Vargas lutou pela emancipação social, política e econômica deste País, como luta hoje o meu Partido. Eu me lembro, Bruza, que em 1964, como em nenhum período da história desta República, o povo estava consciente e maduro para fazer a revolução das transformações sociais. Infelizmente, as correntes fortes e reacionárias deflagraram o golpe em 1964, um golpe que vinha sendo preparado há muito tempo, principalmente, pela UDN.

Eu terminaria dizendo o seguinte: saberiam os senhores quantos milhões de dólares foram aportados a este País para que se desse o golpe contra o Jango? Saberiam os senhores que nas costas do Brasil havia uma operação “Brother Sam”, com o porta-aviões Forrestal, com dinheiro, dólares, munições, petróleo, combustível e armamento suficiente para garantir o golpe que os militares traidores da Nação, da Pátria, tinham preparado a partir das tais de alterosas Minas Gerais?

Portanto, hoje é um dia de reflexão, é um dia de continuação, os ideais de Vargas. Eu concordo com o Ver. Adroaldo Corrêa. Se nós formos fazer uma análise do populismo, nós saberíamos que ele nasceu com Haya de La Torre e que criou alma e coração na Argentina, com Perón, e que chegou ao ápice no Brasil, com Getúlio Vargas, e terminou com João Goulart. Vejam a caminhada do populismo. E terminou com João Goulart. Não existe mais campo de atividade política para o populismo. Ele envelheceu, faleceu, morreu, se alquebrou, está carcomido. Mas os ideais de Getúlio Vargas, os ideais de libertação da Pátria estão de pé, não haverá forças neste País capaz de impedir a revolução social, que eu repito, esta revolução não é privilégio do PT, nem do PSB, nem do Partido Comunista, nem do Partido Democrático Trabalhista. A revolução social será conquista do povo brasileiro em direção às transformações que o País precisa para se libertar econômica, social e politicamente. O sacrifício de Getúlio Vargas simboliza a caminhada deste povo, os rumos da história política desta Nação. E o nosso dever, Adroaldo, é não perder esta perspectiva que é a perspectiva da transformação revolucionária. E o dia que conseguirmos chegar até lá, então, haveremos de ter honrado a Carta-Testamento: “Meu sacrifício não foi em vão, e o meu sacrifício os manteve unidos em torno do meu ideal”. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra, o Ver. Dilamar Machado, que fala pelas Bancadas do PDT e do PMDB.

 

O SR. DILAMAR MACHADO: Exmº Sr. Presidente da Câmara Municipal, neste ato, companheiro trabalhista Clóvis Brum; prezado amigo e velho companheiro de lutas do nosso velho PTB, ex-Deputado cujo mandato foi cassado pela Revolução, Prof. João Bruza Neto; prezado companheiro de lutas sociais, Ver. Lauro Hagemann, que também teve o seu mandato extinto pela força bruta da ditadura; prezado amigo e Dep. Luiz Abadie, representando o Parlamento Estadual neste ato; Major Joel Guimarães, aqui representando o Exmº Sr. Comandante da Brigada, Cel. Jerônimo Braga; companheiros getulistas aqui presentes.

Em primeiro lugar, quero lembrar que os nossos Partidos, PDT e PMDB, a exemplo do que ocorre desde que foi colocado na Praça da Alfândega a Carta-Testamento e o Busto de Getúlio Vargas, já nesta manhã de 24 de agosto, o PDT, sob a liderança desta mulher magnífica que é Neuza Brizola, e o PMDB, com a liderança do nosso Governador do Estado Dr. Pedro Simon, prestaram as homenagens que estes Partidos, juntamente com o PTB, prestam anualmente à figura majestosa de Vargas.

A exemplo do que fez o companheiro Lauro Hagemann e do que acaba de fazer o companheiro Omar Ferri, também eu participei da história, que parece está aqui ao nosso lado, do trágico 24 de agosto de 1954. À época, com 18 anos de idade, eu servia ao Exército Nacional. Filho de getulista, trabalhista desde os meus primeiros momentos de entendimento da história deste País, eu servi ao Exército numa unidade de elite, o Quartel-General da 6ª Divisão de Infantaria e, exatamente às 8h35min, de 24 de agosto de 1954, para meu espanto, um gaúcho que, a exemplo do Lauro, apresentava, a nível nacional, o “Repórter Esso”, Heron Domingues, anunciava, através das potentes ondas da Rádio Nacional, o suicídio de Vargas, ocorrido num dos quartos do Palácio do Catete, no Rio de Janeiro.

E, por estranha coincidência da minha história e da minha vida política, eu vivi aqueles momentos trágicos de dentro para fora. Servindo ao Exército por obrigação legal, filho de um getulista – à época meu pai era Capitão do Exército – e não só getulista como participante da Revolução de 30, ferido em combate levou para o seu túmulo uma bala na perna recebida num dos poucos embates diretos da Revolução de 30. E, ali, eu vivi dias de imensa angústia que talvez muito pesaram na formação do entendimento que tenho deste País.

Inclusive, um fato que talvez a História não relate com todos os detalhes, mas vejam o personagem: quando o povo de Porto Alegre, Ver. Omar Ferri, a exemplo de V. Exª, do Flávio Tavares, do Pedro Simon, do Bruza Neto, do Lauro e de tantos que se revoltaram contra a indignidade daquele momento, destruía os símbolos da oposição, grotesca e grosseira, à Getúlio Vargas, e cometia desatinos, é verdade, ainda há pouco o Bruza me lembrava, o povo ficou tão enfurecido em Porto Alegre que destruiu as instalações da Importadora Americana. Não tinha nada a ver com os Estados Unidos, mas tinha o nome de Importadora Americana, “bailou”, assim como o Consulado Americano, a Rádio Farroupilha, o Diário de Notícias. E, nesses entreveros de rua, um jovem Tenente do Exército Nacional, chamado Menna Barreto, do qual não lembro o primeiro nome, nem faço questão de lembrar, metralhou um cidadão do povo defronte ao Pronto Socorro, matando-o. Esse mesmo cidadão, alguns anos mais tarde, estaria medularmente envolvido no assassinato do Sargento Manoel Raimundo Soares, conhecido como “o homem das mãos amarradas”. Já era, então, Cel. Menna Barreto; posteriormente, General graduado e com várias homenagens no corpo do Exército, mas um profundo e radical participante do Golpe Militar de 64.

Efetivamente, foram dias muito duros, muito difíceis. Talvez naquela época, pela pouca idade, pela pouca prática da vida política, eu tenha vivido mais a emoção de ver um presidente que conheci, casualmente, na mesma Av. João Pessoa, quando Getúlio passou num carro aberto junto com o Governador da época, se não me engano era Ernesto Dornelles, e me ficou marcada na retina, na alma, a figura de Getúlio Vargas. É claro que, pouco depois, pela participação dentro do PTB, passei a conviver com outras figuras que formavam este Partido já destacado nesta Casa. Vou lembrar todos os anos da minha vida da figura do Jango, do João Caruso, Rui Ramos, do próprio Brizola, que hoje é o símbolo da nossa luta trabalhista, a partir do PTB.

Mas, indiscutivelmente, de Getúlio Vargas os meus companheiros já disseram, praticamente, tudo que tinha a dizer. Também sou um homem que vivo em torno de Getúlio e da sua história, com a paixão de quem não admite dele os erros que, eventualmente, tenha cometido, mas reconhece as virtudes do estadista: Previdência Social, Leis Trabalhistas, Petrobrás, Volta Redonda. Diria que o País de Getúlio Vargas foi um outro País, completamente diferente. Até o salário mínimo que Getúlio deixou para o trabalhador brasileiro. A consciência da classe trabalhadora. Praticamente a criação de uma classe, passagem da luta do proletariado para a constituição de uma classe trabalhadora. O salário mínimo de Getúlio Vargas, quando instituído, se comparado com o salário mínimo do Sr. José Sarney, o de hoje não representa, em termos de poder aquisitivo, mais de 15% do salário que Getúlio deu à classe trabalhadora neste País. Era, indiscutivelmente, uma figura das mais exemplares. Quis a casualidade, que nos poucos meses que fui Vereador, pelo então MDB, desta Capital, neste 24 de agosto, há 20 anos atrás, também me manifestasse em nome do MDB, na época, que tinha entre os meus colegas o companheiro Alceu Collares, Lauro Rodrigues, João Satte, Pessoa de Brum, Aloísio Paraguassu, Aloísio Filho, Paulo Lumumba e outros. Eram 11 Vereadores.

Lembro-me que naquela época elaborei escrito o discurso, até porque era outra época. Era o ano de 1969, era talvez o ápice da perseguição, força bruta, do obscurantismo intelectual e político da Nação, e lembro que elaborei um discurso escrito, com extremo cuidado, não por mim, porque acho até que se alguém neste País provocou de modo próprio e conscientemente sua retirada do cenário político, eu fui um dos companheiros que conscientemente o fez, porque nunca fiz concessões à ditadura, à grosseria da época e até a cassação de nossos companheiros. Poucos dias antes de eu ser cassado, lembro que, depois desse discurso do Getúlio, cassaram o Sigfried Heuser, que na época era o Presidente Regional do MDB do Rio Grande do Sul, não tinha mandato. Pois o negócio era tão desgraçadamente triste que, cassado o companheiro Heuser, nós os companheiros da Câmara e Assembléia Legislativa – eu não lembro, mas o Bruza foi cassado em 1969, Lauro Hagemann, Teresinha Chaise Irigaray –  era difícil a alguém até se manifestar. Vocês lembram o episódio da cassação do Glênio Peres e do Marcos Klasmann. Cassado um, o outro foi se manifestar, foi cassado também, tal a brutalidade. Pois me lembro que interrompi – diria hoje até de forma, não digo ousada ou irresponsável, mas emocional – uma Sessão Solene da Câmara Municipal de Porto Alegre em que estava sendo homenageado, naquele dia, o ex-Prefeito Célio Marques Fernandes, com a presença do então Prefeito, que tinha sido nomeado, Telmo Thompson Flores, e eu, talvez até pela idade, vinte anos mais moço, como era Vice-Líder e o Collares não estava no Plenário, pedi Comunicação de Liderança, quebrando o Regimento e protocolo e fui discursar em nome do companheiro cassado, Sigfried Heuser. Eu não tenho nenhum tipo de vingança com o que aconteceu com o meu mandato, acho que o povo recuperou-o no momento em que quis. Acho que foi colocada de forma clara pelo Omar Ferri a história do trabalhismo, acho que o Ver. Adroaldo Corrêa foi muito feliz ao citar a trajetória política do Vargas, as suas eventuais contradições, enfim, o Ver. Artur Zanella, o Ver. Luiz Braz, todos de alguma forma lembraram para todos nós, getulistas aqui presentes, e aos não getulistas, mas que respeitam a memória de Vargas, a importância que ele teve na história deste País. E para mim, 53 anos de idade, é importante saber que eu fui parte desta história.

Apenas para concluir, lembrando a figura de Alzira Vargas, do próprio Maneco Vargas, filho do Getúlio, e mora em Porto Alegre, do seu neto Getúlio Vargas Neto, que mora aqui em Porto Alegre, eu lembraria aos companheiros, que fazem política, que estão diante de um ano eleitoral, de um quadro um tanto quanto confuso, pintado pelas mesmas forças poderosas que vêm desde 30 e que tudo isso que está acontecendo neste País tem uma história só e uma seqüência única. Quando Getúlio levou o povo a uma vitória na Revolução de 30, já estava enfrentando um golpe das oligarquias. Getúlio enfrentou golpe em 45, Getúlio enfrentou golpe em 54 e o PTB enfrentou golpe em 61, enfrentou golpe em 64. Se nós formos fazer o relato, a cronologia e a história das pessoas que foram atingidas pela força bruta nos golpes militares ocorridos, neste País, nos últimos 30, 40 e, principalmente, após a fundação do Partido Trabalhista Brasileiro, eu diria que 99,9% das pessoas atingidas, cassadas, desterradas, presas, com direitos políticos suspensos, sacrificadas, isoladas da participação da vida pública deste País pertenciam ao nosso antigo Partido Trabalhista Brasileiro. Foi contra as idéias de Vargas, consolidadas no PTB, que se ergueram e se erguem as mesmas forças que hoje combatem algumas candidaturas já cristalizadas rumo a uma mudança na própria fisionomia da Nação brasileira em termos políticos, sociais e culturais.

Por isso, é mais uma vez uma honra para mim, como getulista, como filho de getulista e como homem decidido em toda a minha vida pública a acompanhar os ideais de Getúlio Vargas, dizer que o Brasil de Getúlio Vargas não é o Brasil de hoje. Nós dividimos esta Nação em dois períodos: o Brasil de Getúlio e o Brasil após Getúlio Vargas. Que Deus ilumine aqueles que o seguem e que possamos, ao longo dos próximos anos, provar que um homem da estatura moral, política e nacional de Getúlio Vargas não morre. Getúlio está integralmente vivo entre os seus seguidores, entre os seus amigos e, principalmente, entre a classe mais sofrida deste País. Faço apenas a última referência do povo brasileiro, que na época do chamado populismo classificava Getúlio Vargas como “o pai dos pobres”. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: A Mesa Diretora também se associa às homenagens a Getúlio Vargas, requerida pelo Ver. Artur Zanella e subscrita por várias Lideranças da Casa.

E temos a honra de ter aqui na Mesa dos nossos trabalhos o último Presidente da Liga da Mocidade do PTB de Uruguaiana em 64, filho de pai cassado em 64 e irmão de Vereador cassado em 69.

Agradecemos a presença do Dep. Luiz Abadie, que muito nos honrou; do Prof. Bruza Neto, que representa do Governador do Estado, Pedro Simon; do Major Joel Guimarães, representando o Comando Geral da Brigada Militar e dos demais integrantes desta Casa.

Estão encerrados os trabalhos.

 

 (Levanta-se a Sessão às 16h26min.)

 

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